Tatuagem Ancestral

A resistência da arte corporal de 4 povos indígenas pelo mundo.

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O registro mais antigo já encontrado de tatuagens surgiu em 1991, no corpo de um homem congelado datado de mais de 5000 anos, na fronteira entre a Áustria e a Itália. Conservado pelo gelo dos Alpes, o cadáver, apelidado de Ötzi, ostenta nada menos do que 61 tatuagens e nenhuma delas estampa o rosto de uma estrela pop da época.

tatuagensO que já faz deste homem da Idade do Cobre um ser muito mais sábio do que alguns de nós.

 

A descoberta do corpo tatuado de Ötzi, apesar de incrível pela idade e estado de conservação, não chega a ser chocante. Afinal, a arte de tatuar a pele faz parte da história de povos de todos os cantos do planeta, e conta com uma variedade incrível de desenhos, utilidades, simbolismos e métodos. No caso de Ötzi, acredita-se que suas tatuagens tenham sido feitas como parte de tratamentos terapêuticos para doenças como artrose e males intestinais, pois muitas delas estão localizadas em lugares do corpo que coincidem com os atuais pontos de acupuntura. De fato, muitos povos indígenas costumavam tratar doenças com tatuagens.

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Isso se a tribo em questão não tiver sido dizimada antes disso. O aniquilamento de povos inteiros, junto com a devastação cultural e religiosa sistemática desses povos ao longo dos séculos, provavelmente constituem as principais causas do desaparecimento da arte da tatuagem entre os povos indígenas em todo o mundo. Alguns deles, no entanto, ainda resistem e outros, ocidentalizados e modernizados há muito tempo, começam hoje a recuperar e a celebrar as práticas antigas que fizeram parte do seu povo. Abaixo, você confere quatro deles:

A Morte e Ressurreição da Tatuagem Inuit

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Entre o povo Inuit do extremo norte canadense, a arte da tatuagem, antes tão presente e simbólica em suas vidas, foi banida como profana após a chegada do cristianismo. Versos da Bíblia como “Não cortem seus corpos para os mortos ou coloquem marcas tatuadas em suas peles”, selaram a proibição e impuseram uma pausa de mais de cem anos nas práticas de tatuagem dos Inuits. Antes disso, considerada uma arte predominantemente feminina, as tatuagens eram usadas para embelezar o rosto e o corpo, marcar a maturidade para o casamento e, em alguns casos, como parte de tratamentos de dores e doenças.

Hoje em dia, os Inuits estão começando a resgatar a antiga arte. Em 2006, a cineasta independente Alethea Arnaquq-Baril produziu um filme sobre a sua experiência de pesquisa das quase extintas tatuagens Inuits. Em suas filmagens, ela encontrou muitos anciãos de comunidades tradicionais dispostos a falar de suas tatuagens e rituais, muitos deles até aliviados de poderem falar sobre algo que durante tanto tempo foi um tabu. O filme chamou a atenção da geração mais nova, que não hesitou em começar a resgatar os antigos designs e desenhos em seus próprios rostos e corpos.

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A Resistência dos Corpos Tatuados dos Índios Kayabi

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Os povos indígenas da América do Sul estão entre os tatuadores mais prolíficos do mundo, mas o genocídio que sofreram com as colonizações fizeram com que restassem poucas tribos que ainda mantêm a tatuagem como prática. Um deles é o povo Kayabi, que habita hoje o Parque Indígena do Xingu. Para os Kayabi, a tatuagem do rosto serve tanto como uma marca tribal, para identificação de indivíduos como membros da tribo, como com a atribuição da alma dos indivíduos em rituais de iniciação.

Os Kayabi não são originalmente do Xingu, entretanto, e sua luta por sobrevivência ao mudar para o parque fez com que essa tradição quase se perdesse. Foi um membro da tribo, chamado Yxyt, o responsável pelo resgate da tatuagem kayabi. Yxyt aprendeu muito da arte com seu próprio pai e compilou um vasto diretório de nomes e designs kayabi que coletou de outros anciãos da tribo. Preocupado com o constante desaparecimento dos costumes Kayabi, logo ele começou a tatuar meninos e meninas da tribo, resgatando uma prática que não era mais exercida desde a década de 1950. Infelizmente, em 2003, Yxyt foi assassinado aos quarenta anos de idade por fazendeiros brancos. Hoje, dois jovens membros dos Kayabi – Jemy Kaiabi e Kurapi – tentam reaprender a duras penas a sua arte e continuar o seu legado. Contra todas as adversidades, eles resistem.

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Os Vikings e a Tatuagem Neo-Nórdica

Entre as poucas provas que comprovam que os vikings usavam tatuagens está o relato do escritor árabe Ibn Fadlan, que encontrou membros do povo Rus – comerciantes vikings suecos – na Rússia, em 921 d.C. De acordo ele, todos os homens Rus eram tatuados da ponta dos dedos até o pescoço com imagens variadas de árvores e símbolos.

Desde então, a arte persistiu bravamente, tendo sido trazida de volta à vida há cerca de vinte e cinco anos pelos tatuadores dinamarqueses Erik Reime e Jorgen Kristiansen após uma exaustiva pesquisa de tatuagens dos povos celtas, vikings e pictos (antigos escoceses). Depois de passar todo o seu conhecimento para a nova geração de tatuadores tradicionais, composta por artistas como Colin Dale e Kai Uwe Faust, foi cunhado por Dale o termo “neo-nórdico”, que serviu para designar a amálgama de estilos que incluem elementos artísticos de todo o norte da Europa.

O Renascimento do Tā Moko Maori

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No século XVIII, navegadores ingleses chegaram à Polinésia e repararam que, por lá, todo mundo tinha o corpo extensamente tatuado. Foram as práticas de tatuagem dos povos da Polinésia, inclusive, que inspiraram não só os métodos atuais de tatuagem, como o termo que nós utilizamos para ela: a palavra “tattoo” vem do taitiano “tatau”. Entre os Maori, povo nativo da Nova Zelândia, as tatuagens (ou Tā Moko) são verdadeiras obras de arte e servem para decorar tanto o corpo como o rosto. Nas mulheres, as tradicionais tatuagens faciais na boca e no queixo decoram e sinalizam fertilidade, e são chamadas de whakatehe.

Como aconteceu com todos os povos dominados nas grandes colonizações, a cultura maori foi fortemente reprimida ao longo dos séculos e apenas recentemente começou a ser reapropriada pelos seus descendentes. A tatuagem maori começou a resgatada a partir da década de 1990, com homens e mulheres tatuando o corpo e o rosto de maneira tradicional como uma forma de recuperar suas identidades culturais.

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